top of page
Marina Stuginski

COLOCAR UMA COR PARA DAR MAIS VIDA

Atualizado: 14 de nov.




As cores naturais, que são aquelas que são extraídas de vegetais, minerais, fungos, bactérias, líquens, algas e animais, são usadas há muitos milênios pela humanidade para tingir, pintar, colorir e “dar vida” a diversas superfícies, materiais e polímeros; como papeis, tecidos, madeiras, paredes, cabelos, maquiagens, comidas, metais, cerâmicas, vidros, plásticos etc.

Não conseguimos datar desde quando os seres humanos utilizam as cores da natureza para se expressar e para modificar seus ambientes propositalmente, porque provavelmente foi desde quando adquirimos a capacidade de refletir e expressar ideias, então, desde que somos Homo; também não conseguimos datar desde quando os seres humanos iniciaram processos sofisticados de transferir a cor de um corpo para outro com maestria, porque isso se perdeu no tempo; mas o que posso afirmar com certeza, por fazer parte desta comunidade milenar, é que isso sempre foi algo mágico e de muito poder, e mesmo com todo desenvolvimento tecnológico e científico que temos hoje, ainda é;

"mágico, empoderador, criativo e poderoso"


Trabalhar transferindo cores de um corpo para outro, desenvolvendo objetos coloridos, novas cores e processos de obtenção, seja natural ou sintético, a partir de moléculas orgânicas ou inorgânicas, é um processo sofisticado de conhecimento e mestria, tanto que a criação de uma nova cor, sempre gera burburinhos na comunidade científica, afinal, não temos tantas cores para a manufatura, assim como parece.
Muitas das cores que existem são somente modificações de um arranjo molecular existente, como as cores sintetizadas a partir do petróleo, e não uma nova cor, propriamente dita, com matiz próprio e especificidades que ampliam sua aplicação, por exemplo; então trabalhar criando e desenvolvendo cores e seus processos é uma emoção e honra, porque essa comunidade, que trespassa milênios e milênios, gerou para a humanidade muito conhecimento, desenvolvimento, ciências, filosofia e Arte.
Então, eu começo os trabalhos dando um Salve à ancestralidade e a comunidade, que nem sempre é feita de santos, profetas, apóstolos e altruístas, mas, que ainda assim, eu saúdo à memória, envio meu axé e desejo consciência; com amor, Marina Stuginski.


cores


As cores sempre tiveram um papel importante em todas as sociedades, antigas e atuais, porque as cores afetam e desenvolvem papeis importantes em nossa existência; tanto de maneira objetiva, nos corpos biológicos e em todo ecossistema; como também de maneira subjetiva, em nossa psique, através de seus signos; que podem ser interpretados de maneira literal, observando a natureza e retirando significados objetivos e funcionais; como a distinção através da cor de uma fruta verde de outra madura; como subjetiva, como quando criamos, através de signos mais subjetivos, o significado de uma cor.
Por exemplo, por que atribuímos à cor vermelha do semáforo o significado de negação, paralisação, perigo e medo e à verde o significado de “ir em frente”, “o caminho é seu”; se na natureza, algumas vezes, ingerir um fruto verde pode significar dores, doenças, machucados e até morte? Como quando se come uma fruta da Monstera deliciosa ainda verde, o que poderia até ocasionar a morte por sufocamento em algumas pessoas, inclusive. E tem Napoleão, que morreu cor causa de um papel verde.
Verde pode ser arsênio, pode ser radioativa, pode ser tão venenosa quanto vermelha pode ser apetitosa e antioxidante.
Por que, se o amarelo é uma cor ligada ao sol, ao ouro, tão celebrada pela alegria e jovialidade, por que, durante eras e eras, o ocidente teve na cor amarela o signo de morte, incertezas, doenças, mentiras e traições? Afinal, nem tudo que é ourado por fora é ouro por dentro, não é mesmo, alquimistas?! O golpe está aí, cai quem quer!
Conhecido mesmo entre os espertos, é que a fortuna nem sempre está na aparência, pois a pepita pode ter sido bronzeada para burlar os impostos a César. Sabido é que usamos carrancas para afastar o mal.
Mas escreverei sobre os signos de cada cor mais adiante, refletindo suas definições pela natureza da cor e pelos aspectos culturais, subjetivos e relativos à artesania das cores.
Para o texto da vez, quero explorar a expressão secular que escrevi lá em cima: “colocar uma cor para dar mais vida”.

 A relação da cor com a vida é explícita,

talvez porque, quando morremos, perdemos a cor. Todos os seres vivos perdem a cor quando morrem.

As folhas e flores tornam-se cor de palha, a gente, pálidos e gelados, as frutas ficam castanhas...

é como se a alma ao sair do corpo, levasse com ela nossa última respiração e nossa cartela de cores.

Talvez seja daí que venha a palavra extinta.

Extinta

Estar vivo é estar tinto, rubro, corado, e usamos a palavra extinta, para dizer que um ser, que um dia viveu, hoje já não existe mais: Ex-tinta; aquilo que já não tem mais tinta ou que já não possui um corpo material; então, a palavra extinta expressa essa relação direta entre {o existir e a cor}.


Inversamente ao significado de vida e cor, temos os trocadilhos em inglês: to dye – to die.

dye, die

Como eu sempre digo, fazendo o gesto da cruz: tingiu, morreu.
Penso que esse trocadilho seja uma influência das escolas neoplatônicas e estóicas do século I, II, III, IV, dos cristianismos primitivos, dos pensamentos helênicos... Do "ar dos tempos" daquelas culturas mediterrâneas: levantinas, gregas, romanas e egípcias; em intenso comércio e trocas culturais, entre elas e o oriente; persas, Vale Indo, Índia, China... que tanto influenciaram o que viria a ser a língua inglesa.
Porque como disse Aristóteles séculos antes: “as cores são propriedades dos materiais”, e sendo a cor tão propriedade de Vênus, da materialidade; estar colorida, é estar nos “Reinos da Terra” e afastada da etérea e incolor luz celestial; como dizem alguns filósofos da época: "estar aqui, é como estar morto, pois a vida, que é consciência, pertence a outro lugar". Então, ter cor, é ter corpo e ter corpo é não estar totalmente consciente, pois os véus, o corpo, encobrem a realidade das coisas.
No Evangelho de Felipe, Biblioteca Copta de Nag Hammadi, Egito, século II, se tem um versículo que diz assim:

“Deus foi à lavanderia de um levita, tomou 72 amostras de cores e mergulhou na tina, retirando todas brancas...”

Esse mergulho na tina, feito por Deus, era o batismo da purificação, onde esse ser material e colorido, passava a ser descolorido e refletir a luz. Mais tarde, em outros textos, voltarei a esse período para explorar os dados históricos e observar mais fundo esses conceitos místicos e filosóficos do início da Era Comum.

Mas eu vou além, retornando antes da Era Comum, buscar minha inspiração em Asherah, abrindo sua intimidade e nos convidando a entrar na vida, nos apontando a brecha por onde a noite rompe e nasce o sol; nos dando à luz, à luz da consciência, a luz que estimula a abertura dos olhos e a enxergar todas as cores que emanam do universo.



Pois é somente partir da vida, como acreditava-se os povos das Eras antes do Comum, o único modo de se obter consciência da Totalidade, da Verdade. Pois como se diz um ditado hindu, "é somente através de Parvati, que se encontra Brahman". Ou como nos lembra os Sumérios, de quanto foi necessário para o semideus Gilgamesh se lapidar, o corpo animal de Inquidu.

Ah, Gaia! De fartos seios! (Teogonia de Hesíodo). Duas grandes tetas para discernir bem.


Para discernir um lado do outro, o leite bom do leito mau (Gal), duas divinas tetas (Gal), para discernir que, o que é de César e o que é Divino, está separado, mas faz parte do mesmo busto.

Ah, universo de Gaia!

"E assim retorno ao beijo, ao casamento alquímico, que enlaça a Energia Radiante e a Matéria e cria a Cor."


Cor, que também forma coração, cor-ação, que forma coragem, cor-agem etc. E até forma corpo, pois todo corpo tem cor, pois todo corpo é energia radiante e matéria.

Cor também forma “de cor”, que é a expressão daquilo que aprendemos tão bem, mas tão bem, que está escrito no coração e nunca poderá ser apagado.


E então, voltando à Hesíodo, reflito, assim como a cor que reflete dos corpos; que Eros é a cor. {do Caos, de todas as possibilidades, emana Gaia, com seus dois ou quatro seios, que cria o discernimento e a ordem; da ordem de Gaia, é possível sistematizar e materializar, então, o tártaro, o corpo, vem à tona para abrigar Eros, o coração, irradiando cores, 7 cores, porque 7 é o número do sal, e o sal é eterno.


A cor é Eros, Alma, Sophia.


A cor é a filha: sal, mercúrio, logos; que nasce da interação, casamento, cópula, união; da luz com a matéria. Pois a cor é o resultado da quantidade e qualidade da penetração da energia radiante, luz, em um corpo material e sua reflexão.

"A cor é a reflexão, e tudo que refletimos, também internalizamos, decoramos, memorizamos. De cor"


A cor também é a quantidade e qualidade de energia radiante contida em um corpo e que emana para o meio; do que internalizamos e podemos expressar - de cor - pois como, matéria e energia são só dois lados da mesma coisa, os dois seios da mesma Gaia, nosso corpo a todo momento está produzindo energia radiante a partir da matéria e matéria a partir da energia radiante, e emanando para o meio. Podemos observar essa emanação de cores vinda de um corpo, tanto a olho nu como através de aparelhos que captam as ondas eletromagnéticas, por exemplo, quando a emanação está fora do espectro visível.
Talvez seja por isso, por toda essa magia que envolve a cor, sua ligação com a vida, com a consciência, que é abrir os olhos para a luz entrar e ver em cores, sua ligação com o coração, com a alma, com a reflexão, a memória; que cores sempre estão presentes em ritos iniciáticos e em textos sagrados, místicos e mágicos. Então me recordei do arco-íris que Deus colocou no céu como sinal do final do dilúvio e o início de uma nova vida na Terra; mais harmônica e equilibrada. O arco-íris, signo de todas as cores unidas em um arco, é signo também da multiplicidade na unidade e vice-versa. Conta o mito, que a união dos filhos das Deusas com as filhas dos homens, estava gerando muita maldade, pois eram extremos, polarizados, (de um lado, totalmente espiritual, de outro, totalmente material) e assim sendo, eles não conseguiam harmonizar e gerar o que é eterno, porque não havia o meio. Então Deus mandou o dilúvio, as águas, (aquela que não é nem vapor, nem sólida, mas líquida) o meio, a única forma de destruir a confusão e nascer uma nova consciência e juventude e criar o sal, aquilo que é eterno, através do centro; o coração. (é tão ateliê essa passagem... Quem já tentou neutralizar ácido e álcali faltando água no meio? Me contam, indigueiras, que colocam muita cal na extração e depois precisam ficar limpando com acético... já deixaram faltar água no processo e refletir sobre o que acontece, ou melhor, o que não acontece?)
Então finalizo o texto, relembrando a memória da comunidade de Lídia, Turquia, através do Evangelho de Felipe, século II, encontrado em Nag Hammadi, Egito, em tradução minha.

“Deus é um tintureiro. Assim como os corantes verdadeiros, que tingem e só se findam porque existe o fim da matéria, assim são os corantes que Deus nos tingiu:

Eles são imortais”.


Marina Stuginski é quem emana, reflete e escreve este texto.


Sendo Marina autora do texto, é necessário pedir permissão e dar créditos ao compartilhar.

as imagens são propriedades de marina stuginski. a imagem que contém estatuetas de Astarte/Asherá são de propriedade de r/semitic_paganism (via reddit).


Posts recentes

Ver tudo

Comments


bottom of page